sábado, 15 de novembro de 2025

Com medo das sombras. Por Adriana Janaína Poeta CPF.:01233034782 Escrito em: 14/11/2025 Conto/ Ficção In Trilogias In A Varanda Clube de Leitura dos Poetas Todos os direitos reservados.

Com medo das sombras. Por Adriana Janaína Poeta CPF.:01233034782 Escrito em: 14/11/2025 Conto/ Ficção In Trilogias In A Varanda Clube de Leitura dos Poetas Todos os direitos reservados. Enquanto eu digito, invadem o sistema/ Wi fi, incluem erros gramaticais/formatação, movem arquivos. Corrijo quando percebo. Olavo ficou observando a coleção... Reproduções, evidentemente, mas ainda assim, belíssimas. - Francisco José de Goya Lucientes. – Disse Quitéria. A sua voz, forte, feminina, segura, ecoou na sala ampla do velho casarão. Olavo virou-se, imediatamente, para olhar o seu rosto. Gostava de admirar a beleza helênica de Quitéria. Os anos passavam, ele já tinha alguns fios de cabelos brancos... Quitéria, três anos mais jovem do que ele, continuava a mesma... Talvez, mais bela. Parada no último degrau da escada, a poucos metros de Olavo, observava. – “O sono da razão”... Também é o meu preferido, sabe disso. - Eu sei. – disse Olavo, sorrindo. Quitéria caminhou até ele que estava hipnotizado, mal respirava. Ela observou o quadro que Olavo sempre admirava por mais tempo, depois, no rápido movimento, olhou para ele, sempre séria. – Você sempre a contempla mais... Olavo voltou a fitar o quadro. Sim, aquele quadro o intrigava, sonhava com ele, não era qualquer sonho... Ele era o homem, debruçado sobre a mesa de madeira pesada e tosca, tentando proteger-se... - Eu sempre tenho sonhos com este quadro, Quitéria... – Murmurou Olavo, enquanto estremecia, absorvido pela lembrança. – Mas... Nos meus sonhos... Eu sou o homem que tenta proteger-se... - Dos que estão à sua volta... Nas sombras. – completou Quitéria. – Lembro. Já contou isso, diversas vezes!... – Quitéria caminhou até a porta, pesada, antiga como tudo no casarão, a porta que dava para um longo corredor, à esquerda. Ali ficava o escritório da casa, a cozinha, a área de serviço, um banheiro social... Por ali, acessavam o quintal, o pomar, a horta e o jardim. Ele conhecia bem a casa. - Não íamos ao cinema? – ele perguntou. - Decidi que vamos ficar em casa. – Respondeu Quitéria, sem olhar para trás, desaparecendo depois de passar pela porta... Deixou entreaberta. O rangido, longo, rasgando o silêncio do casarão, era inquietante. Olavo percebeu que o corredor estava escuro. As luzes não foram acesas. Quitéria sabia que ele tinha medo do escuro. - Quitéria? Quitéria? - Venha, Olavo. Estou preparando o jantar... Na cozinha. - Acenda as luzes do corredor... Estão apagadas. – Pediu Olavo. Silêncio. Não ouvia um só ruído... Parecia que a casa estava vazia. – Quitéria? Quitéria? – Chamou Olavo, nervoso, junto à porta. Não ousava abri-la mais! Não queria olhar para o corredor escuro! Um suor frio descia do seu pescoço para as costas. O coração começou a bater mais rápido... Uma quentura apoderou-se da sua cabeça... – Não brinque, Quitéria! Sabe que eu não vou até a cozinha com o corredor escuro! - E se acabar a luz? - O quê? - Se acabar a luz, o que você faz? - Quitéria... - Estou brincando!... – disse Quitéria. Olavo ouviu os risos dela. Passou as mãos pelo pescoço, cabelos, rosto... Até para no peito, na altura do coração. Começou a respirar com dificuldade... - “Olavo!... Olavo!... Calma!” – Pensava. Girou os calcanhares, para ver apenas a sala, completamente iluminada. Quitéria acendeu as luzes do corredor. Olavo escutou o barulho. Conhecia cada ruído daquela casa. Os interruptores antigos, barulhentos... - Venha, Olavo! Olavo abriu a porta, certificando de que as luzes estavam acesas, duas luminárias. Os vitrais das duas janelas no final do corredor, com vistas para o quintal, refletiam as luzes dos postes coloniais. Olavo respirou fundo, devagar. Aquele corredor sempre fazia com que sentisse algo incomum, um misto de medo e a sensação de que algo ruim aconteceria. Desde que conheceu Quitéria e entrou no casarão pela primeira vez, sentia aquilo, quando atravessava o corredor. Foi andando, devagar. A cozinha ficava depois da terceira porta, à esquerda. Quitéria não gostava de cozinhar mas, a sua secretária não passava a noite no casarão, então precisava preparar o jantar, quando mudava os planos. Comeriam salada e carne assada, beberiam algo... Talvez vinho. Quitéria mantinha adega da casa bem guarnecida. Quitéria não bebia cerveja, porém sempre havia algumas garrafas na geladeira. Aquele corredor parecia ser mais comprido do que lembrava... Chegou até a cozinha. Quitéria tirava o assado do forno. - Eu pego o vinho? – Ele perguntou, vendo o porta gelo na mesa, vazio. - Na adega, por favor. - Posso escolher? - Claro. Olavo voltou ao corredor. Havia uma porta de vidro, à direita. Ali ficava a adega. Voltou minutos depois. Quitéria estava cortando os tomates. Parecia irritada, preocupada com alguma coisa. Descontava nos tomates... - Quer que eu faça isso? – perguntou Olavo, deixando o vinho na mesa, retirando, gentilmente, a faca, bem afiada, da mão de Quitéria. – eu preparo a salada. Achei que o vinho já estaria gelado... - Farei isso agora. – Disse Quitéria, mergulhando o vinho no gelo, rapidamente. Fez com impaciência, Olavo percebeu, mas decidiu não comentar. - Como foi o seu dia? - Péssimo! – Exclamou Quitéria, sentando-se à mesa. - Percebi. Por quê? - Não quero falar sobre isso!... - Ótimo! Vamos esquecer, então. Jantar, tomar o bom vinho... - isso é bom. - faremos isso, Quitéria. - Quem cortará o assado? - Eu faço isso. Você fica sentada, eu sirvo. – Disse Olavo, sorrindo. Quitéria estava tensa... Olavo buscou os pratos, taças, talheres... - Água, Olavo! É sempre bom ter água na mesa. – Lembrou Quitéria. Olavo abriu a geladeira, pegou a garrafa com água gelada, outras taças no armário... Encheu duas taças com água, entregou uma para Quitéria que bebeu alguns goles, sempre pensativa. Olavo cortou o assado, serviu Quitéria, depois lembrou que a salada não estava temperada... Levantou-se. Procurou o azeite, o vinagre, a pimenta preta moída, o orégano... Misturou tudo no pequeno pote de louça, como Quitéria sempre fazia. Para ela, salada sem sal, para ele, com sal... Olavo colocaria o sal na salada no seu prato. Não queria desagradar Quitéria. - vamos ter que esperar para beber o vinho. – Comentou Olavo. - sim. – Disse Quitéria. Começou a provar o assado. - Parece delicioso, Quitéria. - Está. - Podemos ir ao cinema depois do jantar... - Não! Hoje não... - Tudo bem, ficamos em casa. Ouvimos música. - Para mim, está bom. - Você foi caminhar hoje? - Não. Não faço isso há alguns dias. Não sinto vontade. Olavo fingiu estar distraído com a salada no seu prato, mas observava Quitéria. Ela mastigava cada pedaço do assado como se fosse uma fera... Algo a desagradava. O que teria acontecido? Quitéria tinha o temperamento instável. Bastava uma palavra para destruir a harmonia, e quem a pronunciava era o alvo da sua fúria. - Olavo! – Exclamou Quitéria, largando os talheres sobre o prato, com violência. Olavo parou de mastigar, engolindo o pedaço de carne que levou, segundos antes, até a boca. Desceu pela garganta como se fosse ferro, pesado... Embora a carne estivesse macia, bem temperada, perfeita. Quitéria tinha os olhos agitados... - Sim? - Eu quero contar uma coisa para você. - pode contar. - Eu preciso... Não quero, mas preciso! – Disse Quitéria. Levantou-se, afastando a cadeira, como fez com os talheres. Olavo procurou manter a calma, imóvel, apenas observava. Quitéria caminhou de um lado para o outro, na cozinha. Parou ao seu lado. Segurou a sua mão. – Vamos até o escritório, por favor. – E dizendo isso, o puxou... Com gentileza, mas a gentileza de Quitéria quando estava aflita... Olavo acompanhou Quitéria com seus passos rápidos, até o escritório. Esperou que ela acendesse a luz para entrar. - O que aconteceu aqui?... – Indagou Olavo. Entrou devagar no escritório. Tudo estava revirado! Papéis, livros, objetos, móveis... Nada estava no lugar, a não ser as estantes, aparafusadas e fixas, nas paredes, até o teto. Quitéria foi pisando, sem o menor cuidado, sobre tudo o que havia no chão, até chegar até uma prateleira de uma das estantes. Havia um papel, amarelado, bem dobrado, sobre ela. Todos os livros e porta retratos, objetos, que antes estavam nas prateleiras das estantes, estavam no chão. Quitéria abriu o papel, com pressa, estendeu na sua direção, sacudindo, algumas vezes, até que ele segurou o papel. Era uma carta. Olhou para Quitéria, algumas vezes, enquanto lia. – O que significa isso? - Você leu? - Li. - Você leu direito? - Quitéria... O que é isso? - Hoje, pela manhã, eu estive aqui... Nessa sala... Estava tudo em ordem. Fui com Darciele ao mercado, depois ao banco. Paramos na floricultura... Adoro escolher as flores... Mesmo tendo no jardim. Gosto de ir até a floricultura, fazer os arranjos... Para a sala, para o quarto... Tulipas no quarto, rosas na sala... Fiz isso. Darciele foi embora às 15 horas. Deixou filé de peixe e salada de legumes, preparados para o meu almoço. Almocei as 15:30h. Depois li os jornais. Tomei meu banho. Lembrei que você viria. Estava animada para jantar fora, ir ao cinema... Mas, fui até o escritório. Encontrei tudo como está agora... Isso aconteceu às 19 horas. Você chegou às 20 horas, atrasado... Fechei a porta, fui preparar o assado. Esqueci de colocar o vinho para gelar... Estou furiosa!... - tem todos os motivos para estar! – Disse Olavo. – Quer ir até a Delegacia? Eu falei para você que era preciso colocar grades nas janelas e portas, instalar câmeras com sensores... Você não quis! O Casarão é um lugar inseguro para uma mulher sozinha, sem grades e câmeras!... - Você não entende... - O quê? Alguém invadiu o casarão! Entrou no escritório... - Não. - Não?... - Estava tudo bem trancado. Ninguém forçou as janelas ou as portas. Ninguém entrou no casarão, exceto eu e Darciele. - Como? Quem fez isso?... - Você leu a carta? - Li. - Você leu, mas não entendeu... Olavo respirou fundo. - Algo foi roubado? - Não. - Se ninguém entrou... Quem fez isso? - Quando eu entrei no escritório, tudo estava ano chão... Exceto a carta. A carta estava naquela prateleira. Dobrado. Como se alguém a tivesse colocado lá. De propósito... Para que eu encontrasse. - Quem? Quitéria deixou o escritório, retirando a carta da mão de Olavo. Ele a seguiu. Quitéria foi até a sala. Parou novamente em frente ao quadro que intrigava Olavo. - Sabe quem me deu os quadros? - Não. - Eu ganhei os quadros. - Pensei que você havia comparado. - eu queria comprar, mas... Alguém insistiu em comprá-los para mim. - Quem? - Meu noivo. - Seu noivo?... Nunca soube que havia alguém... - Foi antes de conhecer você, Olavo! Estávamos noivos. Ele escreveu esta carta, antes de viajar para visitar os pais. Moram fora... Nunca mais voltou. - Por quê? - Morreu. Um acidente terrível. Conheci você, meses depois. Não queria comentar... Achei melhor assim. - Mas... O que quer dizer?... Que foi ele quem fez isso no escritório? Não está morto?... - Está morto. - Tem certeza? - Tenho. Fui ao enterro. Vi o corpo. - Quitéria... Não faz sentido!... - Essa carta... Eu joguei fora. - Jogou fora? - Há quinze anos! Olavo, eu joguei essa carta fora! Dobrada, como a deixou para mim. Li, reli, dobrei, joguei fora! Como ela apareceu na estante? Como?... - Alguém colocou ali! - Quem? - Alguém que sabia da carta, do que aconteceu. Para assustar, perturbar você!... Quem sabia sobre a carta? - Ninguém. - Darciele sabia? - Eu não conhecia Darciele, quando meu noivo morreu! Nunca contei nada para ninguém! - O morto não volta, Quitéria! Os vivos fazem isso! - Como? - Alguém sabia da carta! Alguém esteve aqui, enquanto você e Darciele estavam fora... Fez isso! Deixou a carta... Deve estar rindo, agora... Quitéria abanou a cabeça. - Esse era o quadro preferido dele, sabia? - O quadro... - Sim. Ele também sonhava, como você, que era o home, sentado à mesa, escondendo o rosto, com medo... Tentando proteger-se dos que o atacavam nas sombras. (*Referência a gravura de Francisco de Goya: O Sono da Razão Produz Monstros/ 1799). ---------------------------------------

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